Vou pescar no Pantanal, ...ôrra! ou Olha lá o cuiu 27/07/2006

Mulheres amansadas, hotel reservado, barco, van, daquelas que cobram olho da cara e não oferecem nem água, pronto, centenas (ou seriam milhares?) de latas de cerveja devidamente embaladas, garrafas de vinho, máquinas fotográficas, anzóis, linhas, caniço, chinelo dededo e mais uma infinidade de petrechos e lá se foi um grupo de parentes baianos da ...ôrra passar uma semana pescando.

O destino: Pantanal mato-grossense, paraíso de pescadores e contadores de causos e de muitos mentirosos pós pesca.

O objetivo declarado era pescar, pescar e pescar...

Correu uma história de que alguns foram só pra beber, mas não foi possível confirmar.

Em Cuiabá, uns paus rodados do RS, de São Paulo e até do Japão(vamos comer cháshimi de piranha?) refestelaram-se na condução.

Saindo na maior animação, parecia um bando de crianças a caminho da pré-escola, mas, não antes de empanturrarem-se de peixe na beira do Cuiabá, restaurante recomendado pelo dono da diligência (deve ter levado unsporfora).

A viagem seguiu sem incidentes até Porto Cercado, no município de Poconé, a não ser a ...ôrra do calor e da poeira.

Chegando ao porto de embarque, vem a facada. Cadê grana para pagar a carroça? Toca a fazer uma vaquinha, negociação dura, problema resolvido.

Agora é o embarque na ...ôrra da chalana, transfere-se a bagagem, garganta seca, muriçoca, motor roncando, espero que esta ...ôrra não pife no meio do rio...

Nota-se a cara de felicidade dos baianos, alguns com modelitos de pescador, recém adquiridos...

-- Que ave grandona é aquela ali, ali, com cara de flamenguista?

-- É um TUIUIÚ, baiano!

-- Como? CUIUIÚ?

-- Prestatenção, ..ôrra, é um TUIUIÚ, com Tê...

Todos instalados, navegamos a noite toda e chega o amanhecer do grande dia. O barco é competente, a tripulação atenciosa, a cozinheira manhosa...

-- Minha senhora, dá pra fazer um caldinho de piranha?

-- Está começando muito cedo a interferência no meu pedaço... Tratem de comer essas azeitonas, salaminho...

Com muito jeito, conseguimos refazer o miserável cardápio. A falta de um Comandante no barco, quase leva a um motim dos passageiros.

Resolvida a ...ôrra da quizumba, que nunca deveria ter existido, formadas as equipes de pesca, cada uma acompanhada de um piloteiro -- que é o ¨motorista¨ de barco no Pantanal --, conferida a tralha, as iscas, a cerveja (é bom levar água), largam-se ao desconhecido e à aventura.

No primeiro dia, a simples visão de um jacaré, era suficiente para gritinhos histéricos dos baianos...

-- Olha o jacareéééé!!! Olha ali, outro! Olha aquele... que graaandão!!!

-- Olha lá um CUIUIÚ...

-- É TUIUIÚ, baiano burro, ops, desculpe aí tchê!!!

Peixe que é bom, nada...

-- É que agora não é tempo bom pra pescar, a lua não tá boa, jogaram água do Manso (a represa) à noite... Tem muito jacaré... Tcha c’DEUS!!!

...ÔRRA, desculpa não falta. Tá ruim, mas tá bom.

Passam horas, dias, e mais para o fim da viagem, já íntimos, os jacarés eram tratados à base de pontapé, se bem que tem aqui uma história interessante.

Durante uma pescaria, uma dupla achou um jacaré simpático e amistoso e começou a dar restos de peixe como petisco para o bicho. Que nunca tendo sido tão bem tratado, retribuiu seguindo seus novos amigos. Comidinha daqui, gracinhas de lá, cresceu a amizade quase em ritmo de lua de mel. O bichão aproveitando um descuido do piloteiro, pulou embarcação adentro.

-- ...ôrra, pqp, fdp... Petista...

Jamais o Pantanal ouviu tantos impropérios.

Imagine, amigo, o pega-pra-capar que se deu no barco. O piloteiro, pantaneiro acostumado côa a lida, sacou da peixeira e num talho só decapitou a cauda do bicho, que morrendo de vergonha e desenrabado enfurnou-se no coricho.

Pra encurtar, tiveram que resgatar um valoroso baiano encarrapichado no alto de uma árvore que estava a mais de 10 metros do barco, um outro foi encontrado nadando contra a correnteza falando mal do LULLA, do ACM e excomungando todos os jacarés do mundo.

A cozinheira ainda meio enfezada, transformou a protuberância caudífera em sonhados “tira-gosto”.

Três mil quinhentas piranhas depois, muito truco... Pinico de santa casa... Escarradeira de dentista...

-- Dá o sinal direito seu ...ôrra!

-- Ô Japonês, dá mais cháshimi...

Noutro dia, no retorno das duplas, um aventureiro -- dizem que era o PETISTA, que só falava numa tal de “justiça social”, “redistribuição de renda”, “companhêra cozinheira” -- vendo um tuiuiú, promoveu o maior escândalo: que ninguém se mexesse ou dissesse algo.

Silêncio! Ele queria porque queria fotografar o passaralho, digo, o passsarão.

Arma a máquina, regula o diafragma, torce pro bicho não fugir, quietos todos, até que enfim... CLIC. Registrou-se o fato.

Nisso vem um tripulante do barco e chama o pássaro pelo nome:

-- Ulisses, Ulisses!!!

Este atende e vem todo contente fazer festa no meio do grupo. Era amestrado, propriedade de um antigo governador que tinha o barco com base para suas, digamos, reflexões não ortodoxas e paradigmáticas estripulias dantescas. Bem, aí, já são outras histórias... Respeitemos a memória do, para muitos, saudoso personagem, para uns, bem... A vida continua.

No ano que vem, seus baianos da ...ôrra, voltem no final de março.

...

Léo G. Medeiros é cidadão cuiabano

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