João da Silva, 30 anos, chegou há três meses a Cuiabá. Saiu de ônibus do Maranhão, trazendo a mulher Valdirene e o filho, Ribamar, de sete anos, em busca de melhores dias. Hospedou-se na casa da prima Gilcelene, no Pedra Noventa.
Semi-analfabeto e desempregado, na semana passada entrou em um supermercado e furtou um sabonete, um xampu, dois desodorantes e duas cartelas de isqueiro. Algo em torno de R$ 30,00.
Venderia os produtos para comprar cinco quilos de arroz e dois de frango.
Colocou discretamente as “comprinhas” debaixo da camisa e saiu disfarçando entre as gôndolas cheias de promoções para o Dia dos Pais que se aproxima. Mas foi flagrado pelo zeloso segurança do dia.
Sem ¨habeas-corpus preventivo¨, foi algemado, jogado no chão, de bruços, enquanto aguardava a viatura da PM. Logo juntou uma multidão ao redor do João; xingavam o rapaz de ladrão, bandido, sem-vergonha...
Foi conduzido pelos PMs, não adiantou chorar e explicar sua miserável situação, ninguém se comoveu ou interferiu com as autoridades ou com o gerente do comércio.
Ninguém se lembrou de pagar as coisas furtadas, 30 reais libertariam o homem?
Talvez.
Feita a ocorrência, apreendidos os objeto do crime, não faltou testemunha, duas senhoras com grossos anéis e colares volumosos ofereceram-se, céleres.
Estranho fato.
-- Já tive minha casa roubada, explica uma delas, justificando a voluntária contribuição.
Hoje, João da Silva ainda está lá, preso; preso junto com a escória de traficantes, proxenetas, ali no que chamam de “complexo” e enquanto espera julgamento será transferido para o Carumbé.
Se condenado, poderá pegar de um a quatro anos de prisão, sem direito a xampu e muito menos desodorante.
Na pequena casa da prima, a família de João aguarda notícias.
Os parentes que acompanham os escândalos do mensalão, não entendem porque aqueles senhores que “levaram” o equivalente a vários supermercados ainda não foram presos... mas o João...
A mulher não pára de chorar e o filho pequeno continua aos prantos depois que viu o pai algemado no programa policial da manhã.
O delegado-chefe do “complexo”, em entrevista exclusiva, disse que “infelizmente, a lei não dá flexibilidade para tratar ninguém com diferenciação.”
Diante da repercussão, o Ministério Público diz que vai “estudar o caso”. O juiz explica que não decide fora do processo. A OAB na Capital diz que o episódio “é uma coisa lamentável.” O Governador diz que o Estado cumpre o seu papel. O Presidente da República, vocifera contra “as zelite”
No domingo, Dia dos Pais, o pequeno Ribamar não tem marmita para levar ao pai preso.
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Léo Medeiros é cidadão cuiabano.
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